segunda-feira, 18 de maio de 2009

Ainda sem nome - Parte I

Na verdade, mal sabia ele o que estava fazendo, se é que alguém montado em seu ombro que não passava dele mesmo sabia. Continuava a se agarrar à idéia de que buscava ali e nos seguintes passos que daria uma nova forma de perceber o mundo, algo que tivesse um significado inteiramente novo, algo que no contato com as suas retinas devolvesse a energia da sua alma, que parece ter ficado perdida em alguns dos seus exercícios de internalização e externalização de apatia. O ar era feito de inércia. Procurava algo que recuperasse a melancólica serenidade dos seus olhos negros tão novos, mas tão cansados.
Estava impregnado daquela experiência, acontecido de semanas atrás que tirou seu sono, que fez com que os livros que lia fossem mal digeridos, voltando de dez em dez páginas para reler cinco ou seis parágrafos. Aquele claro momento que post factum pode ser afirmado, aquele quadro onde não tinha o que seguir, para onde ir. A sua mente apenas flutuava em algo que quando descoberto destruirá e colocará como pura especulação científica as bases empíricas dos quatro elementos. O que havia era um todo. Esse momento, post factum pode ser afirmado, mas não descrito, pois qualquer descrição é um momento de alienação, a descrição rompe a unidade, única palavra da nossa linguagem que se aproxima daquela sensação. A descrição, assim como uma certa ciência, esquarteja tudo o que percebe. Quando nos demos conta dos nossos olhos de aranha, acabamos por multiplicar a própria realidade e presenteamos cada parte com asas.
Era o ônibus, o calor, a camisa vermelha. O seu corpo em chamas fez com que os seus olhos se voltassem para o céu na tentativa de sentir através dos olhos alguma brisa, algo que trouxesse sossego. A cada solavanco dado por aquele elefante encaixotado, seu íntimo sentia uma mistura de prazer e náusea, algo como um casal apaixonado fazendo amor no esgoto: nem prazer nem náusea deixam de ter intensidade, deixam de dar a impressão de que o corpo humano se rompe e se refaz constantemente. Ambos existiam, não separados, eram como dois amigos bêbados vomitando em si e no outro como sua imagem das meias ao colarinho.
Era essa a sensação que movia o seu olhar que a cada direção lançada expelia uma gosma com aroma de flores. Era essa mesma unidade que unia seu espírito que o obrigava a copular com o céu.
Quando o seu corpo já era erguido como que por plumas e correntes...

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